quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Sua obra.

A professora Graça Alan, no encarte do disco Fazendo Música, pondera sobre o compositor.

“A música torna-se para alguns o caminho mais reto para chegar-se a momentos de intensa harmonia de viver... Registrar esses momentos deve ter sido um dos motivos que levaram Luiz Gonzaga a compor... Observa-se, dentro de sua obra, a preocupação em detectar a inserir em seu contexto musical uma variedade de ritmos, tão próprios de nossa cultura, não bastante isto, chamamos a atenção para importância de suas obras quando estas apresentan-se também inspirada na música universal, com especial destaque para JS Bach, confessada e reconhecida pelo próprio Gonzaga.
É assim,que através de uma técnica fundamentada e entendida como especificamente violonística,que seu trabalho irá proporcionar momentos de construção e enriquecimento para a literatura do instrumento. Através de Choromingos, choros, sincopados, valsas, gigas/barcarola, suíte, prelúdio, capricho, sonata, entre outros, numa escrita própria de quem conhece bem o instrumento, destaca ele, recursos técnicos e expressivos com condução de baixos,melodia e harmonia moderna e um específico caráter espanhol, em momentos que nos remete a F.Tarrega,sem deixar de lembrar os chorões do Rio de Janeiro, bem como aquele que aqui com eles conviveu, Augustín Barrios... “
Graça Alan, Rio 1999







Luiz Gonzaga da Silva é herdeiro direto da tradição didática do violão no Rio de Janeiro. Sua obra é um diálogo constante entre a erudição da Escola de Tarrega, do curso de linguagem da música, dos recitais que assistiu na então capital federal nas décadas de 50, 60 e 70, e o mais fiel espírito popular intuitivo.
Ressaltamos aí a influencia de sua terra Natal (Alagoas), onde desde criança foi ligado à música, tendo observado e participado de várias manifestações culturais e folclóricas; e, principalmente, do Rio de Janeiro, onde desenvolveu todo o seu sentimentalismo, através das valsas brasileiras, das serestas boêmias e dos sambas-canção da década de 50, em conformidade com a temática passional da época.

Na sua vida simples e de hábitos rotineiros, compor era uma função vital, natural, assim como respirar. Ele compôs, com inspirações diversas, um grande número de peças, nas quais distinguimos fases distintas:



1ª fase (Espírito popular x Alma erudita) Década de 40

Um período inicial, de traço popular, em que intuitivamente compunha, além dos estilos de sua terra natal, choros, sambas e valsas com características seresteiras, talvez por influência dos programas de rádio e das rodas de choro que freqüentava.



2° fase (Performance x Didática) )Década de 50

Tempo marcado pela influência dos métodos europeus e por sua atuação como violonista e professor de violão. Neste período iniciou sua produção erudita. Algumas peças têm como modelo partituras de célebres compositores que fizeram parte de sua formação: nota-se claramente a influência de J. S. Bach, J. Pernambuco, Garoto, Dilermando Reis e Baden Powell. Compôs em todos os níveis, com grande dedicação aos iniciantes, mas sem deixar de lado a expressividade em suas frases, nem atentar para um nível técnico elevado. Ele inseria em seu programa de ensino várias de suas peças e também as de mestres como A. Barrios e Manuel Ponce, H. Villa-Lobos, A. Harris, como complemento aos 7 volumes de La escuela de la guitarra, de Mario Rodrigues Arenas, livro este baseado na Escola de Tarrega. Talvez sua produção desperte o interesse dos estudantes tanto de nível técnico quanto de nível superior e os concertistas, pelas características expressivas e virtuosísticas do mais alto nível, seja em peças eruditas, seja nas populares/nacionalistas sua arte é, assim, uma arte de fronteira.



3ª fase (Forma x Inspiração) )Década de 60 e 70

Neste momento, é grande a influência de Paulo Silva. Gonzaga aproveitava para exercitar as formas, os estilos e técnicas de composição, muitas vezes como aprimoramento da escrita contrapontística barroca. Costumava dizer, por exemplo, o que seu professor Paulo Silva dizia sobre esse tipo de escrita: “Se estamos à moda Bach, estamos melhores que todos”.

Uma das reclamações do compositor é de não ter tido uma orquestra à sua disposição para que pudesse testar suas idéias e expandir a produção para a área da música de câmara. Compôs peças para outras formações, como, por exemplo,Arranjos para conjunto popular(Na grade) para piano e violoncelo ou piano solo em réplica ao original para violão –– uma norma em certo período de seu curso de linguagem da Música e Composição.



4ª fase (Compositor x Violonista) )Décadas de 70,80,90,

É o momento da influência de estilos modernos de Villa-Lobos, da Bossa-nova, etc. Com conhecimento amplo dos ciclos tonais, influenciado pelo jazz e pela bossa-nova, Gonzaga fez várias peças populares, algumas até mesmo com referências da música barroca.Destacam-se suas séries de sincopados e de choros:estes são, talvez, uma síntese de suas experiências anteriores mais bem digeridas.


No arquivo do compositor existem várias danças de suítes barrocas, peças sem título, choromingos, valsas, choros, polcas, peças para todos os níveis. Rancheiras, Marchas, Sambas, Maracatus. Existe hoje cerca de 500 manuscritos, o que aponta para a necessidade de uma pesquisa mais extensa para a organização de toda obra, para que não se prejudique a figura desse excelente compositor violonista com a divulgação de material de qualidade duvidosa.


Gonzaga e os Sambas instrumentais.

Podemos constatar, através de depoimentos do próprio Luiz Gonzaga da Silva, a sua predileção pela produção popular. Além de exemplos da cultura nordestina, como o Baião e o Coco, compôs choros, valsas e sambas.

Os primeiros registros fonográficos dos sambas de Luiz Gonzaga da Silva foram gravados no CD Violão brasileiro por Wagner Meirelles (Niterói discos) são eles o Samba sincopado nº1, em “Mí menor” (Exemplo)o Samba sincopado nº2,em “Mi maior”,o Samba Bossa-nova Orangotango.O Samba sincopado nº6 na tonalidade de “Sol maior”foi o terceiro Samba Sincopado a ser gravado ,pela violonista Graça Alan,o (Fazendo música,por 8 violonistas/Niterói discos), ,assim como o de numero 2 apresenta material harmônico seguindo o estilo da Bossa nova.Já o de numero 1 em mi menor apresenta harmonia tradicional mais inclinada para o choro.


O samba-canção, que abriu caminho para a música brega e a Bossa-nova na década de 50, na mão do Gonzaga adquiriu características eruditas e virou Choromingo.Gonzaga assim chamava as peças que fazia em duas partes, em sua maioria sambas-canção, em que, sem perder o lirismo característico do gênero, constituem uma síntese de influências populares e eruditas, absorvidas desde que ele chegou ao Rio de Janeiro em 1945.Diferenciando-se formalmente dos choros do tipo Rondó (A.B.A.C.A). Harmonicamente se influenciara pelo choro, pelo samba-canção e pelo estilo da bossa-nova; tecnicamente, pelo repertório violonístico internacional, erudito e popular.

Gonzaga tinha fascínio pelo Samba canção, sua série de Choromingos possui exemplares com características Rítmicas,harmônicas e fraseológicas recorrentes na música popular, como choromingo nº3 , ou na música erudita erudita, como o Choromingo nº14 , interpretado por Marcus Lerena (Fazendo música/Niterói Discos.)
Fica caracterizada sua atenção ao gênero samba com composições para violão solo. A peça Aprazível, também incluída neste disco, além de Candura, Gravada por Sergio Knust (Fazendo música - Niterói discos),também são choromingos,ou seja,na visão do Gonzaga,sambas canção com influência erudita.

Percebem-se os mesmos traços em seus choros, sambas sincopados e em algumas de suas valsas. Essa mistura, aliada ao caráter romântico do compositor, abre caminho para uma produção repleta de qualidades expressivas e técnicas a serviço da música, Gonzaga sempre desejou que suas peças fossem executadas algum dia por violonistas eruditos tarimbados.


Apesar de ter formação erudita, gostava mais de compor peças populares, independentemente do gênero (valsa samba etc.). Era capaz de fazer aflorar todo o sentimento, em conformidade com a temática passional da década de 50, apelidado de Dor de cotovelo . Costumava dizer que: Quem nunca sofreu não pode fazer boa música . Acreditava fielmente que podia expressar o sentimento através de sua música. Aliás, suas mais bem sucedidas experiências têm características sentimentais.

Leia em seguida Sobre Gonzaga e seu sentimento